quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Potencialidades produtivas da energia solar no Piauí*


A disponibilidade de energia elétrica é hoje um dos requisitos básicos de qualquer empreendimento produtivo. Várias são as vantagens que a eletricidade pode oferecer ao homem no intuito de aprimorar o seu trabalho, aumentando a produtividade e a qualidade dos seus serviços. No meio rural não é diferente, várias são as possibilidades que o fornecimento de energia elétrica pode oferecer ao homem do campo. Todavia, muitos produtores rurais piauienses na atualidade ainda desconhecem os benefícios que a eletricidade pode proporcionar. Nesse cenário, tendo em vista as potencialidades produtivas locais e a não disponibilidade de energia elétrica em várias regiões rurais do Estado a opção fotovoltaica apresenta-se como uma alternativa promissora.
Uma das grandes vocações produtivas que o Piauí possui é a apicultura, apresentando-se como o maior produtor de mel do Nordeste e o segundo do País. A região de maior produtividade está encravada no meio do semiárido piauiense, em especial na micro-região de Picos, apresentado a maior concentração de apicultores do Brasil. Além dos fatores ambientais[1] que favorecem esse cenário, políticas públicas de incentivo e capacitação de produtores estão dentro dos principais motivos que ao longo das três últimas décadas consolidaram esta prática no Estado. A grande vantagem da apicultura no semiárido piauiense deve-se ao caráter social que a atividade desempenha, possibilitando a geração de renda e a melhoria na qualidade de vida dos pequenos produtores, base principal do processo produtivo.
Nessa atividade, o caráter familiar é uma constante. Em geral, pequenos produtores rurais de uma mesma comunidade formam uma associação de apicultores e iniciam o processo produtivo, contando com o apoio técnico de instituições governamentais e/ou não-governamentais.  Um dos passos iniciais desse processo é a construção de uma edificação que servirá de sede para associação: a casa do mel. Essa edificação abrigará todos os equipamentos necessários para o beneficiamento dos produtos e subprodutos da apicultura, que geralmente necessita de atividades noturnas. Em localidades não eletrificadas a tecnologia solar fotovoltaica apresenta-se como alternativa promissora no fornecimento de eletricidade de qualidade às casas do mel, possibilitando melhorias reais nas condições de trabalho. A figura 1 ilustra o processo produtivo do mel no semiárido piauiense, com destaque especial à opção fotovoltaica na eletrificação das casas de mel em locais não conectados à rede elétrica. 

Fig. 1 - Processo produtivo do mel, com detalhe na inserção fotovoltaica. 39

Duas outras vertentes de atividades produtivas regionais com potencial para aplicação fotovoltaica são a pecuária e a ovinocaprinocultura, especialmente na eletrificação de cercas. A pecuária no Piauí apresenta-se como a primeira atividade econômica, fazendo parte da sua tradição histórica e cultural. Já a criação de animais menores e adaptados para regiões áridas tem origens mais recentes no cenário estadual, porém apresenta na atualidade grande representatividade no mercado nacional, especialmente os caprinos cujo rebanhos são o segundo maior do Brasil.
Em ambos os casos, a prática extensiva de criação é majoritária, sendo normalmente realizada de forma amadora por pequenos e médios agricultores rurais. Contudo, este tipo de prática compromete a produtividade e reduz o aproveitamento do couro. Levando em conta essas peculiaridades, o sistema de produção agrossilvipastoril apresenta-se como alternativa promissora, tanto na conservação dos recursos naturais, quanto no ganho de produtividade agropecuária. Esse modelo, desenvolvido pela Embrapa Caprinos em Sobral (CE), baseia-se na subdivisão da propriedade rural em três porções (agrícola, pecuária e reserva legal) a serem explorados em sistema de rodízio. Nesse contexto, a utilização de cercas eletrificadas (figura 2) apresenta uma série de vantagens, dentre elas: o custo inferior (menos material), melhoria na qualidade do couro, baixa manutenção, facilidade de modificação/transferência, redução no uso de madeira, etc.

 F 2 - Modelo de cerca elétrica com quatro fios adotando para caprinos e que pode ser alimentado com gerador fotovoltaico

A piscicultura é outra atividade de grande potencial regional que pode também contar com a opção fotovoltaica. Esse tipo de geração pode atuar em três frentes diferentes de aplicabilidade: no fornecimento de água, no processo de aeração e na conservação do pescado. No primeiro caso, o fornecimento de água fica assegurado através da utilização de sistemas fotovoltaicos de bombeamento de água. O segundo caso trata-se da utilização de um arranjo fotovoltaico para acionar um dispositivo apropriado que induz a oxigenação da água em reservatórios controlados (lagos artificiais), de forma a reduzir a mortalidade dos peixes e intensificar a produção. O terceiro caso refere-se à mini fábricas de gelo acionadas também por painéis fotovoltaicos.
A figura 3 apresenta detalhes de um sistema fotovoltaico de aeração para criação de peixes de forma intensiva em lagos. Esse sistema foi instalado em Israel e apresentou satisfatórias condições de operação durante os dois anos em que foi estudado, isso se aplica aos componentes dos sistemas e aos instrumentos de medida. Os componentes principais desse sistema são: arranjo fotovoltaico (848 Wp – 16 módulos), controlador eletrônico de carga (24 V - 25 A), banco de bateria (500 Ah), motor elétrico (400 W - 1500 rpm) e equipamentos de medição. O lago em questão possui 150 m² e a existência de baterias é justificada por possibilitar o funcionamento do sistema mesmo durante a noite. Essa configuração pode ser alterada e adaptada para as condições especificas locais, para isso faz-se necessário a realização de pesquisas.
 Fig. 3 - Ilustração de sistema fotovoltaico de aeração, utilizado na piscicultura. 41
Além desses casos supracitados, a opção fotovoltaica apresenta-se também promissora em outras atividades produtivas piauienses, tais como: cajucultura, umbucultura, agricultura orgânica, nos processos produtivos da cera de carnaúba e da farinha de mandioca, dentre outras. Para isso, porém, faz-se necessário investimento em pesquisa e desenvolvimento e em políticas públicas, com o objetivo de mudar paradigmas.
O aproveitamento de outros potenciais energéticos (eólica, biogás, biodiesel) da região, associado à opção fotovoltaica, pode contribuir para fortalecer esse tipo de geração. Para isso, tornam-se necessários a adaptação e o dimensionamento, segundo as necessidades de demanda, com soluções de acordo com as características locais. Portanto, trabalhos de pesquisas nesse setor devem ser realizados, de forma a aumentar as chances de sucessos de empreendimentos nessas culturas.


[1]     Dentre os principais fatores ambientais estão a florada silvestre e diversificada, proporcionado uma produção em praticamente todo o ano.


* Texto publicado originalmente em http://migre.me/7f0VP




quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Energia Solar no município de Alto Longá (PI)


O município de Alto Longá localiza-se na porção leste do Território Entre Rios, a aproximadamente 70 km de Teresina. A origem do município é datada do final do século XIX, sendo criado a partir de uma fazenda de gado. Atualmente, o município possui uma população de 13.612 habitantes (IBGE, 2007), distribuída em uma área de 1.621 km². 
Localização do município de Alto Longá, Piauí
Segundo dados da CEPISA de dezembro 2008, o município apresenta aproximadamente 800 famílias desprovidas do fornecimento de energia elétrica. Entretanto, mesmo a população que já tem acesso a esse serviço público padece da baixa qualidade no atendimento, principalmente devido às quedas de tensão e interrupções no fornecimento. Tais características dificultam o processo de abastecimento de água do município. Como alternativa a esta realidade, a prefeitura municipal instalou cerca de sete sistemas fotovoltaicos de bombeamento de água, sendo quatro sistemas na zona urbana e três na zona rural.
O interessante desse empreendimento energético refere-se aos locais onde os sistemas fotovoltaicos de bombeamento de água foram instalados, ou seja, em lugares já eletrificados (rurais ou urbanos). A justificativa para isso, segundo a empresa contratada para fazer as instalações, refere-se à baixa qualidade no fornecimento de energia elétrica da rede, o que provocava constantes problemas nos equipamentos de bombeamento de água existentes. Em contrapartida, os sistemas fotovoltaicos de bombeamento apresentam-se com maior confiabilidade, apesar de possuírem um custo inicial bem maior.
Duas dessas instalações foram visitadas em pesquisa de mestrado (dissertação disponível em: http://migre.me/74j2u). A primeira instalação pesquisada encontra-se no Bairro Baixa das Carnaúbas, zona urbana do município. Segundo entrevistados, esse sistema foi instalado em 2006, sendo composto por 10 módulos fotovoltaicos de 70 Wp, um motobomba e um reservatório de água de 10.000 litros. Abaixo segue fotos do local.

 Sistema fotovoltaico de bombeamento de água, Bairro Baixa das Carnaúbas - Alto Longá, Piauí.
 A segunda instalação encontra-se na localidade Brejinho, situada à aproximadamente 2,2 km da sede do município. Na localidade vivem cerca de 160 famílias, que sobrevivem da agricultura familiar e da criação de pequenos animais. Devido à proximidade com a cidade, a localidade foi eletrificada há mais de 12 anos. Os moradores entrevistados relataram que além de ser monofásica (MRT) a energia elétrica que abastece o lugar é de baixa qualidade. Com isso, eram frequentes as quedas de tensão e a interrupção no fornecimento, o que ocasionava aviarias ao sistema de bombeamento que existia na comunidade. Esse sistema antigo foi substituído em 2006 por um sistema fotovoltaico de bombeamento d’água, que compreende 08 módulos fotovoltaicos de 75 Wp, uma motobomba e um reservatório com capacidade para armazenar 10.000 litros de água potável.


Sistema fotovoltaico de bombeamento de água, localidade Brejinho - Alto Longá, Piauí.

Em ambas as instalações, o sistema estava operando normalmente e não sofreu ações de depredadores. A manutenção é realizada pela mesma empresa que instalou os sistemas. Além disso, a comunidade não participou diretamente do processo de implantação. Porém, manifestaram total aprovação quanto à qualidade do bombeamento. Na localidade Brejinho, a comunidade reclamou apenas da necessidade de ampliação do sistema de bombeamento para atender a demanda crescente por água.

 Albemerc

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Energia elétrica e desenvolvimento no Piauí*


 É comum, atualmente, associar desenvolvimento somente a crescimento econômico, aumento de renda, industrialização ou avanço tecnológico. Em crítica a essas visões mais restritas, o economista e Prêmio Nobel, Amartya Sen, propõe uma concepção mais adequada de desenvolvimento, que deve ir muito além da acumulação de riquezas, do crescimento do PNB (Produto Nacional Bruto) ou de outras variáveis relacionadas à renda. Segundo ele, o desenvolvimento tem que estar relacionado, sobretudo com a melhoria das condições de vida e das liberdades desfrutadas. Assim, para ele a liberdade é o principal fim do desenvolvimento, sendo que a pobreza é vista como forma de privação de liberdades.
 
O acesso à energia elétrica na atualidade pode atuar como facilitador do processo de redução destas privações de liberdades, visto que pode permitir o funcionamento de uma infinidade de equipamentos, que por sua vez possibilitam melhorias no bem-estar das pessoas. A disponibilidade de energia elétrica, portanto, configura-se como um fundamental recurso facilitador da vida humana, uma vez que permite uma melhor qualidade de vida e um maior aprimoramento de seu trabalho.
Sabemos hoje que o PNB é o indicador mais utilizado para medir o desempenho de uma economia na produção de bens e serviços, por conseguinte, é muitas vezes associado ao consumo e à produção de energia. Contudo, indicadores sociais como o IDH podem estar fortemente correlacionados ao consumo de energia. Partindo desta prerrogativa, podemos fazer uma análise comparativa no Estado do Piauí entre o acesso à energia elétrica e o IDH. Dessa análise constatamos que há uma correlação entre os municípios com baixo acesso à energia elétrica e os municípios de menor IDH. Os casos extremos são os municípios de Teresina (maior IDH) e Guaribas (menor IDH), que apresentam respectivamente os maiores e menores índices percentuais de eletrificação. Assim, embora esta simples comparação entre indicadores não seja conclusiva, podemos inferir que existe uma relação muito estreita entre o acesso à energia elétrica e o desenvolvimento. No entanto, deve-se ressaltar que o simples acesso à energia elétrica não é suficiente para permitir o desenvolvimento de uma região, como muitos programas de eletrificação rural sugerem.
A realidade da zona rural piauiense não difere muito da de outros Estados do Nordeste, principalmente na região semiárida, onde os períodos de estiagem são mais prolongados e as consequências da seca são mais severas. Aqui, a disponibilidade de energia elétrica pode contribuir de forma satisfatória para a melhoria das condições de vida da população e para o desenvolvimento regional. Dentre os vários benefícios que a eletricidade pode oferecer para o sertanejo, um é essencialmente mais importante: o acesso à água potável. Além disso, a melhoria na qualidade de iluminação, o acesso melhorado à educação, saúde, abastecimento de água, geração de renda, etc. Neste contexto, o acesso à energia elétrica pode ser considerado como uma forma de liberdade e, portanto, está relacionado diretamente ao desenvolvimento. No entanto, embora exista uma relação entre o acesso à energia elétrica e o desenvolvimento, outros programas sociais devem estar associados aos programas de eletrificação rural. Para que os benefícios da eletricidade possam promover de fato reais melhorias nas condições de vida da população envolvida.

        * Texto publicado originalmente por Albemerc Moura de Moraes no dia 03 de maio de 2010 no jornal Meio Norte (Teresina - Piauí)
Relação entre o índice de eletrificação do Piauí e o IDH-M.